Roda de Conversa
Falamos de arte com o artista plástico Carlos Daniel
E em que momento de sua vida descobriu seu amor pelas artes?
– Eu era marceneiro mas observava com muito interesse um amigo meu que desenhava e pintava muito bem. Naquele momento percebi que eu tinha que aprender a desenhar. E me dediquei de corpo e alma a este propósito.
Tempos depois fui viver na África onde a falta de materiais nos leva a buscar soluções criativas e , muitas vezes, fora do comum. Nos cinco anos que lá vivi aperfeiçoei a minha técnica e sobrevivi com a minha arte.
Na verdade, queria ter sido cantor. Mas não consegui. No entanto, realizei um outro sonho e me tornei um artista.
Como despertamos um dom dentro do nosso ser?
– Todos temos muitos dons e, se tivermos atentos vamos ver que a vida sempre nos oferece oportunidades para que estes dons sejam revelados. Sou muito feliz como artista. E é esta felicidade que pretendo ver brilhar nas realizações também no Adhara.
Nós temos que buscar o que nos realiza, e não o que é esperado de nós. A resposta está dentro de nós.
O que o senhor sente que esta experiência no Adhara lhe trouxe?
Mais uma vez compreendi que para vencer desafios é preciso flexibilidade e criatividade moldando nossas ideias em contextos novos para que elas se tornem realidade.
Abaixo alguns depoimentos dos participantes sobre esta experiência:
Flexibilidade de materiais
“Nosso desafio inicial foi o de elaborar um busto numa visão tridimensional. Mas para isso, precisaríamos de muita argila e a peça ficaria muito pesada. Na busca de soluções criativas para a realização da nossa atividade prática, solicitamos ajuda ao artista plástico, Carlos Daniel, que nos orientou no procedimento da modelagem trazendo ideias inovadoras para o nosso desafio.
Com ele, aprendemos a planejar o trabalho, construir a base e a pensar na edificação da estrutura para a realização do mesmo. Jornal, palito de churrasco, argila, argamassa e gesso fizeram parte da nossa experimentação”.
Perceber as proporções
“Amassar, modelar, prensar, ajustar o tamanho e a forma da cabeça e do pescoço foi o início do nosso desafio. Cabeça grande, pescoço curto, cabeça pequena, pescoço longo: a difícil arte de ajustar as proporções”.
“O segundo passo foi moldar a estrutura com a argila. Sentir a umidade e a temperatura fria da argila, perceber que o material gruda um pouco nas mãos, conceber a necessidade de colocar mais água na massa para dar liga e amaciar, alisar e contornar espaços curvilíneos, estruturar o tamanho e as proporções dos olhos, nariz e boca e cuidar da peça no decorrer do trabalho, umedecendo o pano sobreposto ao busto, foram ações que atribuíram vida em nossa arte”.
Sentir o resultado
“Aprendemos a sentir, cheirar, observar, experimentar, mexer, torcer, alisar, furar, grudar e a administrar diferentes quantidades de massa nas mãos, observando o tempo de secagem de cada material na peça.
Fizemos o gesso. Água com pó de gesso. Nova experimentação: mão seca, mão úmida, mão suja. Controlar o tempo da massa foi o outro desafio. O gesso pede movimentos mais rápidos. Ele tem um tempo diferente.
E hoje na roda de conversa abrimos nossos corações para contar um pouco do processo individual na construção do busto”.
Trabalhar os desafios
Os adolescentes e jovens expressaram a dificuldade de estruturar o tamanho e as proporções dos olhos, nariz e boca. Puxar a massa para estruturar o nariz foi difícil para alguns deles. Alinhar os olhos em harmonia com o nariz e a boca também não foi fácil.
Observando a instalação que montamos no Instituto Adhara, com o objetivo de dar visibilidade a nossa arte, percebemos que nos diferentes bustos expostos não havia orelhas.
Para os surdos a orelha não é fundamental, comentou um adolescente: “O surdo é visual, vê e escuta com os olhos”.
Outro adolescente achou que o busto que ele fez ficou com o pescoço muito para trás: “parece que levou um susto!”.
No processo de construção o que ele mais gostou de fazer foi idealizar e arquitetar a estrutura interna que segura o busto.
Outro adolescente ao ver a instalação pronta com todos os bustos, lembrou da imagem do Monte Rushmore, nos EUA, um monte onde estão esculpidos os rostos de quatro Presidentes dos EUA.
E o que o artista plástico Carlos Daniel achou?
Carlos Daniel, artista plástico voluntário, complementou a observação elucidando que a arte é atemporal e ultrapassa o limite dos espaços demarcados pelo homem, sem sair do lugar. “A arte nos leva a outros países, a outras culturas, a liberdade, ao conhecimento, ao passado, ao presente e ao futuro”.
Para o orientador social Walker, a diversidade dos bustos foi muito interessante: “Usamos os mesmos materiais, aplicamos as mesmas técnicas e cada um fez um busto diferente. Nenhum ficou igual”.
A intenção
O artista falou sobre a intenção que cada um colocou na sua arte.
“Levamos nossa história, nossa visão de mundo e nossas emoções para a arte. Uma obra nunca é igual à outra. Somos diferentes e nos completamos pelas diferenças. Todas as obras aqui são bonitas e criativas. Ninguém copiou as imagens de outros artistas. Fomos criativos, reais e autênticos. Isso que é importante. Quem copia não cria”.
Alguém observou que uma das esculturas lembrava o menino do filme “O Extraordinário”. Então, disse o artista: arte é um passaporte para o imaginário. Você lembrou do filme, foi além da imagem construída. A arte te dá asas, possibilidades infinitas.
Carlos Daniel, o senhor já nasceu artista? – Perguntou um adolescente!
Eu aprendi mais do que ensinei e me realizei intensamente. Existe nesse contexto uma verdade e uma pureza muito grande e a satisfação que esse grupo demonstrou em aprender. Eles conseguiram realizar uma bela amostra de talento.
Um adolescente perguntou:
A arte lhe satisfaz?
Muito. Satisfaz e realiza.
Eu dou aula por ideologia. Tive o privilégio de receber muitas informações.
Os verdadeiros mestres criam outros artistas.